5. VERBOS E ADJETIVOS-I

Um “verbo” é toda palavra que transmite ideia de ação ou estado. Para fins de ilustração, observe os modos e tempos verbais que a língua portuguesa possui:Felizmente, na língua japonesa, os verbos são muito regulares, pois, ao contrário da língua portuguesa, não flexionam de acordo com o sujeito (ufa!!). Também, os tempos verbais básicos são “não-passado” e “passado”.

<<<O QUE FOI EXPOSTO ACIMA É MUITO IMPORTANTE!!>>>

Para ilustrar essa facilidade da língua japonesa com relação aos verbos, para fins meramente didáticos e que explicaremos depois, vamos fazer de conta que no português também seja assim (seria uma maravilha, não é mesmo?), ou seja, imagine que “na língua portuguesa há só dois tempos verbais básicos e que os verbos não flexionam de acordo com o sujeito”.

Agora que entramos no mundo do “faz de conta”, imagine que a forma não passada seja o verbo na forma infinitiva e a forma passada seja a terceira pessoa do pretérito perfeito. Assim, a nossa conjugação imaginária, tomando como exemplo o verbo “beber” seria: Como a língua japonesa não possui os tantos modos e tempos verbais que existem na língua portuguesa, tenha sempre em mente que muitas vezes nos depararemos com ambiguidades. Haverá casos em o que o modo e tempo verbal de uma construção específica a serem considerados quando traduzida para outro idioma, se dá pelo uso prático da língua, adquirindo, assim, um sentido próprio.

Antes de iniciarmos o estudo dos verbos em sua classificação moderna, há alguns princípios muito importantes que você deve fixar:

PRINCÍPIO 1: uma sentença gramaticalmente completa requer um verbo somente (incluindo o estado de ser).

A única coisa que precisará ser feita para tornar a sentença gramaticalmente completa é um verbo e nada mais! Entender esta propriedade fundamental é essencial para compreender o japonês. Este é o motivo de mesmo a mais básica sentença japonesa não poder ser traduzida para o português! Todas as conjugações começarão a partir da forma do dicionário (como elas aparecem no dicionário). Uma sentença gramaticalmente completa, por exemplo, é 「食べる」 (traduções possíveis incluem: Eu como/ele(a) come/eles(as) comem).

PRINCÍPIO 2: com exceção dos irregulares, todo verbo é composto por duas partes: uma invariável e outra variável, que é aquela que sofrerá alterações nas conjugações.

É muito fácil fazermos um comparativo deste conceito com os verbos da língua portuguesa, pois funcionam da mesma forma. Por exemplo, o verbo regular “cantar” possui seu radical “CANT-” que é a parte invariável e o sufixo “-AR”, do qual surgirão todas as terminações quando flexionado. Vejamos sua conjugação no presente do indicativo:

· Eu canto

· Tu cantas

· Ele canta

· Nós cantamos

· Vós cantais

· Eles cantam

Veja que a parte CANT- permanece inalterada em todas as flexões que o verbo sofre, e o que muda é tão somente o que se segue depois dele, isto é, a terminação.

Na língua japonesa, as diferentes flexões que um verbo pode ter são denominadas “BASES” e há tão somente seis bases de conjugação. Aprendê-las é um passo fundamental para o domínio das classes de palavras que são flexionadas no japonês, embora infelizmente costumam ser deixadas de lado nos cursos convencionais. Nós vamos nos referir a essas bases por seus nomes em japonês. Observe:

1. Mizenkei: é a base que, salvo exceções que veremos mais adiante, é utilizada para formas verbais que expressam fatos que ainda não ocorreram;

2. Ren'youkei: é a base utilizada para conectar elementos variáveis, isto é, verbos (auxiliares) e adjetivos;

3. Shuushikei:  é o verbo na forma infinitiva. Este tipo de conjugação também é chamado de "forma básica / forma de dicionário". Sendo assim, quando você quiser procurar por um verbo no dicionário, deve procurá-lo nesta forma, pois as outras bases não aparecem no dicionário. Tem esse nome porque era a forma utilizada no Japonês Clássico para encerrar as sentenças;

4. Rentaikei: é a base utilizada para conectar elementos invariáveis, como substantivos e partículas;

5. Kateikei:  é a base usada com partículas que dão noção de algo hipotético, como em “se isso acontecer...”. No Japonês Clássico e especialmente no Antigo, era utilizada como uma base para ações concluídas, fato que ainda deve ser considerado em algumas construções arcaicas específicas;

6. Meireikei: é a base usada como forma de comando.

As bases variam de acordo com o grupo ao qual o verbo pertence. Atualmente, os verbos podem ser classificados em três grupos, que chamaremos simplesmente de Grupo I, Grupo II, Grupo III e Irregulares. Vejamos:

A. Grupo I: a terminação da base “passa” por quase todas as vogais. Vamos pegar como exemplo o verbo “falar”, que em japonês é 「はなす」: Veja como as terminações (em vermelho) passam por quase todas as vogais na ordem japonesa, isto é, “A -I -U -E – O”, diferentemente do português, em que se segue o padrão de vogais “A – E – I – O – U”.

Os verbos do Grupo I podem ter nove terminações infinitivas. São elas: 「う」, 「く」, 「す」, 「つ」, 「ぬ」, 「む」, 「る」, 「ぐ」 e 「ぶ」. Vejamos um quadro com exemplos: Agora, baseados nas possíveis terminações, vejamos como ficam as bases de conjugação (considerando-se somente a terminação da forma infinitiva e suas mudanças): B. Grupo II: são os verbos cuja parte invariável termina com a letra I e a parte variável, RU. Vejamos alguns exemplos: Agora, vejamos o padrão de bases deste grupo, tomando como exemplo o verbo 「おちる」(落ちる), que significa “cair”: C. Grupo III: são os verbos cuja parte invariável termina com a letra E e a parte variável, RU. Vejamos alguns exemplos: Vejamos o padrão de bases deste grupo, tomando como exemplo o verbo 「たべる」(食べる), que significa “comer”: Um ponto muito importante é que há verbos do Grupo I que possuem a terminação “~I+RU” e “~E+RU”. Vejamos alguns exemplos:

ENTÃO, COMO SABER A QUAL GRUPO PERTENCE UM VERBO NESSES CASOS?

Para diferenciar precisamos considerar fatos históricos, que neste livro não iremos abordar. Entretanto, como regra geral (existem exceções!), um verbo do Grupo II ou do Grupo III terá a sílaba I ou E escrita em Kana. Veja alguns exemplos:

1) 「走る」 é lido 「走」(はし) . Veja que o fonema 「し」 está dentro do Kanji, não sendo escrito em Hiragana. É verbo do Grupo I;

2) 「漲る」 é lido 「漲」(みなぎ) . O fonema 「ぎ」 também está dentro do Kanji. É verbo do Grupo I;

3) 「投げる」 é lido 「投」() げる. O fonema 「げ」 é escrito em Hiragana. É verbo do Grupo III.

D. Irregulares: os verbos irregulares são assim chamados, porque suas bases não seguem o padrão das outras classes verbais. Felizmente, há apenas dois verbos irregulares na língua japonesa.  São os verbos 「する」, que basicamente significa “fazer(-se)” e 「くる」(来る), cujo significado é “vir”. Vejamos as respectivas bases:

Com relação ao verbo 「する」 mencionamos que ele basicamente significa “fazer(-se)”, porque, na verdade, ele possui diversos significados (o Jisho.org aponta pelo menos 10!!). Dentre eles estão “agir como”, “vestir” e “considerar”. Qual significado considerar depende da construção e do contexto.

Conhecidas as classes de verbos, vamos agora nos focar em algumas particularidades dos verbos na língua japonesa. A primeira delas é que alguns verbos possuem mais de uma forma de escrita possível. Como exemplo, consultemos no site “Tangorin” o verbo 「あう」 (会う):

Veja que além de 「会う」, o referido verbo possui mais três formas de escrita possíveis. No caso do Tangorin, as mais comuns são marcadas com uma estrela. É importante ter isso em mente, pois diferentes escritas de um mesmo verbo podem aparecer em diferentes níveis do JLPT ou mesmo acrescentarem algo ao significado. Por exemplo, a escrita 「逢う」 do verbo 「あう」 pode dar a ele uma conotação dramática, sendo usada frequentemente para pessoas próximas.

Como já mencionamos a Base Meireikei é usada como forma de comando. Por isso vamos (re)ver como ela é formada:

I. Verbos do Grupo I: a base Meireikei se trata da coluna do E, considerando-se a terminação do verbo:

Veja alguns exemplos:

! = Beba!

!= Escreva!

II. Verbos dos Grupos II e III: é formada anexando-se 「ろ」  ou 「よ」 à parte invariável do verbo:

!= Veja!

食べ! = Coma!

A Base Meireikei com 「よ」   é a original e o uso de 「ろ」 é um recurso do Leste do Japão (japonês padrão). O uso com 「ろ」 é o mais comum, e a utilização de 「よ」 pode dar uma sensação nostálgica.

III. Formas de comando irregulares: ao se tratar da forma de comando, há três verbos que merecem atenção. São os verbos 「する」, 「くる」 e 「くれる」:

A Base Ren'youkei de um verbo pode funcionar como um substantivo. Na verdade, em casos muito raros, ela acaba sendo usada mais frequentemente do que o verbo em si. Por exemplo, temos o verbo 「休む」(やすむ), que significa descansar. Se pegarmos sua base Renyoukei, isto é, 「休み」, teremos o substantivo descanso.

Vale lembrar que você não poderá usar este processo em todos os verbos (no sentido de obter um significado de substantivo relacionado ao verbo). Também, existem muitas combinações de verbos (Base Ren’youkei + Base Ren’youkei) que são utilizadas principalmente como substantivos. Vejamos alguns exemplos:

読み書き: leitura e escrita (読む」 + 「書く」);

買い上げ: compra (「買う」 + 「上げる」);

受け付け: recepção (de hotel, etc.) (「受ける」 + 「付ける」).

Ocasionalmente em substantivos formados a partir desse processo (simples e compostos) o okurigana é retirado na forma substantiva:

「話」 (はなし), proveniente do verbo 「話す」 (はなす) falar e que significa história, fala;

「係」(かかり), proveniente do verbo 「係る」 (かかる) concernir, envolver e que significa oficial, pessoa encarregada de algo”.

「受付」 (うけつけ) forma simplificada.

Outro modo comum de se obter substantivos de verbos é anexar 「物」 (もの), substantivo genérico que significa coisa (tangível), à base Renyoukei do verbo. Provavelmente, o exemplo mais conhecido desta formação seja 「着物」 (きもの), que significa literalmente coisa que se veste, originado do verbo 「着る」 (きる) = vestir e 「物」 (もの) = coisa. Aqui vão mais alguns exemplos:

「食べ物 (たべもの): comida (proveniente do verbo 「食べる」 (たべる) = comer);

「生き物」 (いきもの): ser vivo; criatura (proveniente do verbo 「生きる」 (いきる) = viver);

「買い物」 (かいもの): compra (proveniente do verbo 「買う」 (かう) = comprar);

「詰め物」 (つめもの): enchimento, recheio, incluindo a obturação de um dente cariado (proveniente do verbo 「詰める」 (つめる) = comprimir);

Infelizmente, não se pode anexar 「もの」 a qualquer verbo. Portanto, verifique o dicionário antes de usá-lo.

NOTA: não confunda 「物」 (もの) = coisa com 「者」 (もの) = pessoa, usado para se referir a si mesmo ou a pessoas próximas.

Algumas formas substantivas de verbos podem ser usadas como sufixos. Por exemplo, 「付き」, proveniente do verbo 「付く」, que significa estar anexado a, pode ser colocado em um substantivo [X] para expressar que algo está anexado a [X]. Sendo assim, 「カメラつき... , significa, em uma tradução menos literal, [algum equipamento, dispositivo] que contenha uma câmera, como um smartphone (smartphone com câmera).

Outra particularidade dos verbos japoneses é que há alguns verbos (que chamaremos de “suplementar”) que podem ser anexados a outros para ampliar seu significado. Por exemplo, o verbo 「だす」(出す), que significa “tirar”, ao ser anexado a outro verbo (no caso, à base Ren’youkei), transmite o significado de “começar a...” (「食べだす」= começar a comer).

Talvez a questão mais complexa dos verbos japoneses seja a TRANSITIVIDADE. Numa rápida definição, verbos transitivos são verbos que precisam de um objeto direto para que tenham sentido completo, enquanto os verbos intransitivos carregam um sentido completo por si mesmos, dispensando o objeto direto. Sendo assim, como regra geral, a partícula 「を」 não deve ser usada com verbos intransitivos.

A transitividade é um atributo do verbo em si e essa informação é dada por bons dicionários. Veja um exemplo:

Então, se você se deparar com uma oração, cujo verbo está sem o objeto direto, não significa necessariamente que ele seja intransitivo; ele pode ser transitivo, sendo o objeto direto apenas desnecessário para o contexto.

Embora haja verbos que por natureza sejam transitivos, como 「教える」(おしえる), que significa “ensinar”, e outros que sejam intransitivos, como 「死ぬ」(しぬ), que significa “morrer”, há alguns verbos que possuem duas formas diferentes quanto à transitividade. Por exemplo, veja a dupla a seguir. Ambos os verbos significam “abrir”:

➩ 開ける 【あける】= Verbo transitivo;

➩ 開く 【あく】 = Verbo intransitivo.

A diferença é que um pode ter um objeto direto, enquanto outro, não. Sendo assim, pode-se dizer que um verbo transitivo implica que alguém executa a ação, ao passo que um verbo intransitivo implica que a ação ocorre sozinha. Veja os exemplos com a dupla de verbos “abrir”:

ドア開ける。= Abrir a porta (implica que alguém executa a ação de “abrir a porta”).

ドアが開く。= A porta abre (e abre por si mesma).

Verbos que possuem duas formas quanto à transitividade, tecnicamente têm o mesmo significado do ponto de vista japonês, mesmo que sejam traduzidos para outras línguas de forma diferente.

Alguns verbos intransitivos japoneses podem ter um objeto para que seus sentidos sejam indicados de forma completa – pelo menos, a palavra equivalente será considerada um objeto (direto ou indireto) do verbo quando a frase é traduzida (corretamente) para o português. Nestes casos, a partícula 「に」 exerce a função de marcador do objeto de um verbo intransitivo japonês. Observe o exemplo:

試験受かる。 = Passar no exame. (“no exame” = objeto indireto)

Também, esses verbos que possuem duas formas quanto à transitividade normalmente compartilham o mesmo ideograma, sendo que a diferença está na terminação escrita em Hiragana. Observe o quadro com mais alguns exemplos desses pares de verbos:

Por fim, tratemos dos Adjetivos-I. Você deve estar se perguntando o motivo de abordá-los juntamente com os verbos. A resposta é simples: é por que eles funcionam de forma semelhante aos verbos!!

Como assim? Para que você entenda usemos a língua portuguesa: você concorda que, por exemplo, se quiséssemos expressar a grandeza (tamanho) de uma casa poderíamos dizer tanto (1) “casa grande” ou (2) “casa que é grande”? A diferença aqui é tão somente a presença de um verbo entre o substantivo e o adjetivo “grande” em um dos casos.

Agora imagine se em português só existisse a forma (2) de atribuir qualidades a um substantivo (“substantivo” que é...). Se assim fosse, seria possível conjugar o verbo “ser”, não é mesmo? No nosso exemplo, poderíamos expressar “casa que ERA grande”, “casa que SERÁ grande” e assim por diante.

Em japonês TODOS os Adjetivos-I possuem como que o verbo “ser” implícito (e por isso são conjugados!). Isso os livros convencionais não contam!!

Sendo assim, por exemplo, embora o Adjetivo-I 「おもしろい」(面白い) seja traduzido comumente como “interessante”, o correto seria atribuir a ele o significado “SER interessante”. Assim,

面白い雑誌。= Revista que é interessante. (tradução convencional: Revista interessante).

Assim como os verbos, os Adjetivos-I possuem uma parte invariável e uma parte variável, que tão somente a terminação 「い」. A única diferença é que originalmente cada Adjetivo-I possui dois conjuntos de bases.

Para melhor explicar isso, teremos que fazer uma abordagem histórica, inevitavelmente.

No Japonês Clássico, os Adjetivos-I eram divididos em dois grupos (Shiku e Ku), de acordo com a flexão de suas bases Ren’youkei do conjunto く (lembre-se que os eles possuem dois conjuntos de bases). Vejamos essas duas categorias com suas respectivas bases:

I. Tipo SHIKU (usando como exemplo 「楽し」):

II. Tipo KU (usando como exemplo 「高し」):

Em dado momento da História, houve perda de diferenciação entre as bases Shuushikei e Rentaikei e também mudanças sonoras. Foquemo-nos nas bases Rentaikei do conjunto く de ambos os tipos de Adjetivo-I usados como exemplos, isto é, 「楽し」 e 「高し」:Concluímos que houve uma mudança sonora no último fonema 「き」 da base Rentaikei do conjunto く em ambos os casos, fato este que deu origem às formas modernas dos Adjetivos-I. Sendo assim, os que eram do tipo Shiku atualmente terminam em 「~しい」 e os que eram do tipo Ku, em 「~い」.

Veja que se usa a base Rentaikei dos Adjetivos-I para se atribuir algo à outra coisa. Consequentemente, por lógica é natural pensar que é possível usar verbos, já que eles também possuem base Rentaikei. Considere a seguinte oração em português:

A PESSOA QUE MORRE.”

A oração acima pode não fazer muito sentido, mas o importante aqui é que você perceba que o fragmento “que morre.descreve o tipo de pessoa da qual estamos falando. Em japonês, podemos construir esse tipo de oração usando a base Rentaikei dos verbos, a fim de fazer com que eles modifiquem diretamente outro termo:

死ぬ。= Morrer. → 死ぬ人。= Pessoa que morre.

E isso vale para qualquer forma verbal, que aliás, nós veremos mais adiante.

Mencionamos que podemos usar a base Ren’youkei de um verbo para transformá-lo em substantivo (ou pelo menos para que se porte como tal). Isso também seria válido para os Adjetivos-I?

Observe o quadro abaixo:Alguns podem imaginar que esse procedimento “transforme” todos Adjetivos-I em substantivo. Bom, poderíamos dizer que sim tecnicamente, mas na prática não é o caso. Em outras palavras, nem todos se tornarão substantivos autônomos “utilizáveis”, pois tal recurso não é comum e é aplicado apenas a alguns casos.